terça-feira, 12 de agosto de 2008

No palco sem fronteiras


A flor de que era feito o nosso amor.
A orquídea coadjuvante -- ou protagonista? -- está com pendão de botões. Tempo de amar se aproxima, é o que sinto. A platéia aguarda...
A flor de que será feito o nosso amor.
***
Amanhã (13 de agosto) sigo a Belgrado e meu coração está mudo. Já me sinto solitária, sem as fadas de Kars, sem as trouxinhas de Lord Ganesh da Índia, sem a companhia das oliveiras palestinas. O desconhecido...

domingo, 10 de agosto de 2008

Conto de fadas. Outra ciranda de Ferdinanda.



O caminho estava cercado por fadas
Fadas e flores
Flores e abelhas.


Ela cheirava pólen, ela cheira a pólen.
Ela...
Voava! Batia as asas sofregamente.
Puro prazer, sabia.
Missão, vocação, natureza.
Natureza...


Ah, suspiros encheram o vento de inquietações,
Inquietações gostosas, daquelas que fazem cócegas.
E então?
E então ela não sabia.
Sentia, voava, beijava as flores, ouvia as fadas.
Apostava corrida com as borboletas.
Desistiu de ter medo.


E, com a terra, as plantas todas, os solos misturados,
Os minérios, os minerais, os olhos d’água,
As línguas e os idiomas, os sabidos e os não-compreendidos,
Floresceu esplendorosamente mágica.
As fadas:
Três desejos.


Antes de dizer, experimentou. Sentiu.
Os sons todos. Memórias não-vividas explodiam.
Borbotões.
Borboletões.


Quero amar.


Arco-íris. Curvas, curvas,
Contornos, as montanhas caucasianas,
Os montes de fenos, os pastores,
Mais flores, dança de fadas.


Quero continuar voando.


Oh, o pólen.
Que delícia o pólen.
As vilas, a sabedoria, os xamãs,
Os tempos sem verbo, os verbos além dos tempos.
No princípio era o Verbo, por si mesmo princípio,
Verbo principal da conjugação primordial.


Quero sempre ser. Ser sempre. Ser.


A partir de hoje, princesa.
Colméia cheia de células,
há as escuras que guardam as sombras,
e as muito claras que guardam os desejos mais impossíveis.
E as de todos os dias, aconchegantes.
Beba do néctar,
Banhe-se em pólen.
Vente-se. Reinvente-se.
Voe. Vá, venha. Viva.
Sempre.


As flores. As fadas.
Os desejos sonhados zunidos
Ao ouvido muito atento.


O arco-íris apontou, uma vez mais,
O caminho.
Mágico esse caminho...
Cercado por fadas e flores e abelhas.
Quantas delas!

*** A profecia de Joana ***

A princesa

A princesa se preparava para entrar na Igreja de São Gregório de Tigran Honents. Noite de estrelas, lua crescente. O casamento estava próximo, mas ela não queria. NInguém podia vê-la ali. Escondida, a princesa aguçava seus sentidos. O som dos grilos, o som do rio, o som do vento. Um cântico profundo que brotava sob seus pés. Enquanto cantassem as vozes ancestrais, ela podia correr. Aquela era a igreja da promessa.
Eles não falavam a mesma língua. Eles não tinham a mesma religião. Mas se amaram. Loucamente, com os olhos, com as bocas, com os corpos. Ela, princesa. Ele, sultão.
E na Igreja de São Gregório de Tigran Honents, sob os afrescos vívidos das histórias bíblicas, sob os olhares atentos de Jesus, de Maria, dos apóstolos, dos anjos e dos pássaros que lá tinham seus ninhos, eles fizeram a promessa. Tinha uma beleza nos olhos cor de mel de ambos, na tez clara dela, na tez morena dele. Nas vogais de seus suspiros e gemidos, de seus sorrisos e de suas lágrimas ternas e mornas. Queriam ficar juntos, queriam criar uma outra nação, outro reino, outro império, uma planície de margaridas só para eles dois, e se alimentarem do mel das abelhas selvagens, tão caridosas. São Gregório, proteja-nos!
A princesa, ofegante, entrou na igreja.
Ele não estava lá.
Nos tempos imemoriais, os homens cumpriam suas promessas a não ser que.
Angustiada, ela adormeceu atrás do altar. Que meus sonhos me levem daqui, pensou.
Que seus sonhos a tragam aqui, sempre, ouviu.
Voz feminina.
Abriu os olhos. Uma jovem alta, loura, cabelos raspados, olhos azuis, roupas em farrapos, olhava lúcida e carinhosa para ela.
Ele. Ele não pode vir. Ele jamais poderá vir. Ele está preso à lua crescente, à estrela, ao vermelho do sangue das conquistas.
A princesa sentiu a dor das impossibilidades.
Não, não sofra. Doa apenas. Impossível não existe.
Joana?, balbuciou a princesa, sem controle sobre suas palavras.
Sou eu. Sabia que você se lembraria de mim -- foi você quem me sorriu antes da fogueira me arder. E eu me prometi curá-la da dor, fazer de tudo para voltar ao momento do corte mais profundo e lhe dizer que o impossível não existe.
Mas ele...?
Ele foi no momento que tinha que ser, princesa.
Os cânticos lá de fora se fizeram mais forte. As estrelas também cantaram. A lua, a lua crescente, a lua-luta que aprisionava seu amante, até a lua ajudou a entoar o lá. O lá e o sol. Dó.
Mas e eu...?
Você, princesa, você voltará sempre aqui quando o amor se anunciar. Essa será sua compensação, por assim dizer. Você, sempre princesa. Você, de tempos em tempos aqui. Trazida pelo vento, pelas abelhas, olvidada dos passados todos. Mas escutará os cânticos que ouve agora, se lembrará do sultão, voltará a ser princesa e amará. Amará loucamente. Amará perdidamente. Para depois se esquecer e ser esquecida, mas eternizada nas doçuras dos amantes. Como o sultão lhe pensa agora: doce, melada de amor e de desejo, de sonhos e da ausência dele.
Joana...
Eu não sofri, princesa. Porque você brilha sempre. E eu amava naquele momento, e você brilhou para mim. E você me adoçou, me adocicou e me salvou.
Uma nota fora do tom dos cânticos da terra acordou a princesa. Assustada, não enxergou mais nada. Pediu uma vez mais proteção a São Gregório e deixou a igreja. Correu, correu, correu, escapando do casamento arranjado, do corte profundo, do destino fatalista.


E quando voltou era brasileira, tinha 33 anos, falava português e vestia uma saia marrom.
E Joana estava de novo lá, cumprindo a promessa das lembranças todas.

Das lembranças todas.

Joana, à esquerda, em sua última aparição





>>> "Just in time", na voz de Nina Simone

"I want you", na voz do Skank <<<

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Faces de um novo mundo

Somos poetas de um tempo presente.
De uma vida presente.



Cantamos -- e carregamos muitos outros conosco.


Havemos de amanhecer, poetas, havemos de amanhecer.

Por isso, continuemos a entoar nossos versos de alvorada não importa a vista alheia cansada ou nosso cansaço mesmo.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Paisagem da varanda


O Bósforo está ali na frente.
E meu coração, cá dentro, cuja batida anda um pouco ofuscada pelas tosses que ecoam fundo nos pulmões, suspira em contentice desmedida. Um dia a gente casa, Istambul, um dia a gente casa.
Fico feliz em constatar que, embora viajando e caminhando e vendo muito, não perdi a capacidade de me extasiar com as paisagens do momento presente. São lindas, sempre. Porque são do aqui, porque são de agora.